Patrícia Fernandes
O alto investimento é o principal vilão para quem deseja ingressar em uma graduação numa instituição particular de ensino no Distrito Federal. Na maioria dos casos, o valor das mensalidades é alto e, por isso, muitos alunos almejam uma bolsa de estudos, seja ela integral ou parcial. Entretanto, ser contemplado está longe de ser a solução. Prova disso são as dificuldades que 200 universitários participantes do Programa Bolsa Universitária, criado em 2007, vêm passando. Isso porque o Governo do Distrito Federal (GDF) está dificultando o repasse dos recursos às instituições de ensino superior.
Além disso, o GDF não pretende abrir mais vagas para o programa. Segundo a Fundação de Apoio à Pesquisa do DF (FAPDF), porém, na verdade o Bolsa Universitária deverá ser substituído por uma nova modalidade de bolsas de estudo, o programa Jovem Universitário, que terá edital de seleção que prevê 650 novas bolsas de graduação. Procurados pela equipe do Jornal de Brasília, órgãos do GDF ligados ao programa não responderam aos questionamentos.
Substituição
Enquanto isso não acontece, o governo tem adotado o programa Jovem Educador, lançado em abril deste ano. Assim como no Bolsa Universitária, ele tem a proposta de trazer estudantes para dar aulas em escolas públicas. A diferença entre eles, porém, é que enquanto no projeto antigo o aluno ganha uma bolsa que pode ter valor variável; na mais recente, apenas dá uma ajuda de R$ 462 para custear alimentação e transporte dos agentes.
Uma das pessoas atingidas pelo problema é a estudante do 7° semestre do curso de Psicologia Araci Ribeiro. Ela tem o nome da lista dos contemplados pela bolsa universitária, mas está com dificuldades para renovar a matrícula. “A Secretaria de Ciência e Tecnologia, responsável pelo pagamento, não está passando o dinheiro para a universidade e, por isso, a instituição se recusou a renovar a matrícula, alegando que como o órgão não tinha arcado com o custo, eu teria que pagar”, relata. Para conseguir renovar, a estudante declara que se viu obrigada a recorrer ao âmbito judicial. “A universidade estava irredutível, mas por fim acabou cedendo e renovei a matrícula”, conta a estudante.
Constrangimento
Araci Ribeiro conta que a sua sensação é de constrangimento e revolta. Afinal, está sendo cobrada por uma dívida que não é sua. “Todo semestre é a mesma novela. Eles mandam a cobrança e nós temos que correr atrás. É vergonhoso ter que passar por isso. Estou perto de me formar e a ansiedade de dar algo errado é muito grande”, desabafou a jovem.
Números
200 bestudantes participam
100% é quanto é custeado da mensalidade, sendo 80% pelo GDF e 20% das instituições.
650 novas bolsas estão previstas para o programa Jovem Universitário
Ponto de Vista
Para o professor de Direito da Universidade de Brasília (UnB) Alexandre Bernadino, o universitário não pode arcar com uma dívida que é do governo. “Geralmente, o governo não tira dinheiro do bolso. Ele é fruto dos impostos que a sociedade paga”, destaca o professor.
Segundo ele, a renovação da matrícula também é um direito do aluno, já que o débito não é visto judicialmente como um fator que o impossibilite de estudar.
Alunos têm de correr contra o tempo
A estudante de psicologia Kelly Rodrigues Alves, 39 anos, passa por situação parecida com a de Araci Ribeiro, aluna do mesmo curso. “Quase perdi um semestre por falta de pagamento. A faculdade não recebe os valores desde 2009 e, por isso, resolveram cancelar a bolsa. Nós, alunos, ficamos no meio de uma guerra, eles não queriam renovar e a Secretaria de Ciência e Tecnologia pedia calma”, conta a estudante. Para conseguir renovar a matrícula e garantir a continuidade dos estudos, ela também entrou na Justiça.
De acordo com a estudante, o resultado da batalha judicial foi positivo, pelo menos em parte. “Consegui que a instituição não me responsabilizasse pela dívida. Porém, eles podem cancelar o contrato por falta de pagamento”, afirma. Ela destaca que a incerteza tem sido sua fiel companheira. “Toda época de renovação a história se repete”, lamenta a universitária.
Segundo Kelly, os bolsistas ainda precisam driblar a falta de escolas com educação integral. “No Distrito Federal só tem duas escolas que nos aceitam. Quem não conhece ninguém do GDF fica sem local para ficar”, declara. Ela ressalta que o aluno que não cumpre as quatro horas de estágio exigidas pelo programa corre o risco de perder o benefício. “Quem não cumprir pode deixar de fazer parte do programa. Por isso, temos que correr contra o tempo para conseguir resolver todas essas questões”, disse a estudante.
Precariedade
De acordo com o deputado federal Izalci Lucas (PSDB-DF), os alunos beneficiados pelo programa estão desamparados. “Os estudantes estão largados. O GDF simplesmente não paga as mensalidades há algum tempo. Por isso, o maior problema encontrado por eles é para renovar a matrícula”, disse.
O deputado destaca a importância do programa: “Ele contribuiu para a diminuição da evasão e a repetência dos alunos do ensino básico”, concluiu Izalci.
Ele explica que o programa não ganhou a atenção necessária por parte do novo governo. “Infelizmente neste governo não houve o incremento, foi apenas mantido o que já existia e, ainda, de uma forma precária. Muitos acabaram desistindo porque não existia a flexibilidade com relação as 20 horas”, relatou.
Pagamento após meses
Na avaliação do deputado federal Izalci Lucas, mesmo que indiretamente, os alunos são estimulados a desistir da participação no programa. “Eles (governo) dificultam ao máximo para fazer o aluno desistir. No caso do estágio em uma escola da rede pública, por exemplo, o governo teria que indicar uma vaga. Porém, na prática o aluno é obrigado a procurar”, ressaltou. Ele destaca ainda que o atual governo acabou com o programa. Ou seja, novos bolsistas não são aceitos.
De acordo com o deputado, o descaso do GDF com o programa cria uma imagem negativa. “O próprio GDF passa uma imagem de que não tem interesse na qualidade da educação. Muitos alunos tinham o sonho de entrar na faculdade e quando o governo assume se cria essa dificuldade. Esses alunos se inscreveram dentro da lei e agora passam por isso”, lamentou o deputado.
Dívida
De acordo com o Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos Particulares de Ensino Superior do Distrito Federal (Sindepes-DF), a entidade sindical formalizou, em março, por meio de um ofício, o pedido de repasse das verbas do GDF para que os participantes do programa Bolsa Universitária pudessem fazer as matrículas e continuar estudando.
No ofício, destinado ao governador Agnelo Queiroz e à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda (Sedest), o sindicato afirma acreditar em um desfecho satisfatório para todas as partes envolvidas na questão do programa Bolsa Universitária. No documento, o sindicato também destaca que em fevereiro de 2013, o governo reconheceu a dívida, tendo o governador Agnelo Queiroz solicitado o pagamento, inclusive das parcelas em atraso.
Depois de muito esperar, o governo fez o repasse do recurso. Mas antes disso, acumularam-se problemas no processo de matrícula dos alunos contemplados pelo programa. No ofício, o sindicato havia destacado a urgência de uma resolução para o impasse.
A reportagem do Jornal de Brasília entrou em contato com a Secretaria de Ciência e Tecnologia, responsável pelo programa Bolsa Universitária. Contudo, a assessoria de imprensa do órgão afirmou que a Secretaria de Comunicação Social iria se pronunciar sobre as denúncias. Entretanto, até o fechamento desta edição não houve respostas. Enquanto isso, resta a incerteza sobre o próximo semestre.
Fonte: Da redação do clicabrasilia.com.br
Nenhum comentário: