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Bons tempos aqueles. Havia até o verbo “malufar”. Se alguém era acusado de roubo, logo lhe apontavam o dedo acompanhado do insulto: “Malufou”.

Hoje, se depender da presidente da República, ninguém rouba – comete “malfeito”.

Outro dia, ela demitiu mais de 20 pessoas do Ministério dos Transportes envolvidas em “malfeitos”– em roubo, jamais.

Não sem razão. Afastamento ou demissão por suspeita de roubo obrigaria a abertura de inquérito. E ao cabo de um inquérito, a pessoa pode escapar incólume ou ser processada. É sempre arriscado.

Demissão ou afastamento por “malfeito’, não. Fica a nódoa na biografia do atingido, mas ela dura pouco. A memória coletiva é fraca.

Tiro por Brasília, onde moro desde 1982.

É crescente o número de políticos bandidos que trafegam sem restrições em pontos de intenso movimento. Nunca vi um só deles ser hostilizado.

O senador cassado Luiz Estevão, condenado por roubo, é olhado com inveja quando pilota sua Ferrari amarela.

Apesar dos cabelos brancos - ou da escassez de cabelos no caso de alguns-, meia dúzia de senadores de vários partidos acreditou mesmo assim na balela do que a imprensa batizou de “faxina ética”. E há duas semanas procurou para uma conversa a ministra Gleisi Hoffmann, chefe da Casa Civil da presidência da República.

O que passa, minha amiga Gleisi? Por que a presidente começou e depois suspendeu a “faxina ética”? Se for por falta de apoio no Congresso, estamos aqui para apoiá-la, argumentaram.

Gleisi cortou a esperança deles de uma tacada só: “A governabilidade é quem dita os limites da “faxina ética”.

Traduzindo para leitores pouco versados na língua exótica dos políticos e dos jornalistas que escrevem sobre política: presidente só governa se contar com maioria de votos no Congresso. Quanto mais folgada, melhor.

Em certas questões, você não pode contrariar os que o sustentam sob pena de ser abandonado. “Faxina ética” não lhes interessa.

A eles interessa a elasticidade das regras da administração, a falta de fiscalização rigorosa e a cumplicidade explícita ou disfarçada do poder público com a roubalheira.

É por isso que o verbo “malufar” saiu de moda, sabia? E é por isso que os políticos não mais se envergonham de Maluf. Ficaram parecidos com ele.

Diferente do passado. Políticos respeitados, e aqueles que ocupavam cargos de destaque, evitavam ser flagrados confraternizando com Maluf. Pegava mal.

Alguns mais enfezados como o ex-governador Mário Covas, de São Paulo, sentiam prazer em espinafrar Maluf. E se valiam disso com inteligência para vencer eleições.

Quem, hoje, se elegeria espancando Maluf? O contrário é possível.

Dono em São Paulo de fatia expressiva de votos, Maluf pode ajudar a decidir uma eleição. É cortejado, pois, por quem precisa dos seus votos.

Há pouco, do governador Geraldo Alckmin para baixo, quem conta na política de São Paulo foi à festa de aniversário de Maluf.

Temos, pois, que o arrenegado, beiçudo, bode-preto, canhoto, cão, capeta, coisa, coisa-ruim, coxo, diacho, excomungado, maldito, mal-encarado, malvado, pé-de-cabra, pedro-botelho, porco, sujo, tentador ou tinhoso perdeu a carga de malignidade que o distinguia com ou sem razão dos seus pares. Virou um de nós!

Perdão! Virou um deles.

A política “malufou”. Cada um ao seu modo, os três poderes da República “malufaram”.

Na última década, segundo a revista Veja, 39 juízes foram investigados pela Polícia Federal. Deles, 31 acabaram denunciados à Justiça e sete chegaram a ser julgados. Apenas dois foram condenados. E só um está preso – em casa.

Maluf, a mulher e quatro filhos do casal respondem desde a semana passada a mais um processo criminal por suspeita de lavagem de dinheiro.

Novidade? Qual o quê!

O único fato novo, concreto, registrado desde a interrupção da “faxina ética” foi o roubo de vassouras plantadas no gramado do Congresso durante um ato contra a corrupção.

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